sábado, 31 de outubro de 2009

Como no cinema

Maria João Madeira, in catálogo Festival Temps d'lmages


Primeiro ouvimos. A música irrompe de um plano totalmente a negro, brevemente iluminado pela inscrição das letras brancas dos créditos de produção, fugidias para deixar a imagem voltar ao escuro até que o raccord se faça pelo som, na primeira das vezes que a ela se adianta, regra dos encadeamentos dos 97 seguintes minutos. Então o negro é alumiado por pontos de luz bran­ca no topo e, no fundo do enquadramento, na obscuridade do plano de conjunto em contra-picado frontal sobre um palco escuro elegantemente rasgado por esses focos de luz que recortam as silhuetas dos instrumentos e dos músicos já em cena, avança a figura esguia de Jeanne Balibar. Da penumbra, a primeira canção, de palavras dilaceradas, tom intimista e magoado, é "Torture". As variações da imagem dão-se, discretas, no interior do plano pelas mudanças de intensidade e da incidência da luz de acordo com os movimentos das personagens, como será também regra dos demais planos. Neste primeiro, o ponto de vista é o dos espectadores do concerto. No fim da canção, Balibar agradece recatadamente os aplausos e retira-se, tal como os músicos. O palco fica vazio, a imagem obscurece para as letras brancas do título, NE CHANGE RIEN. Entretanto o filme prossegue sem corte, no off da banda som, no fora de campo de um ensaio. É em cena, como cantora, como actriz cantora, e é fora de cena, como cantora, como actriz can­tora, que Pedro Costa filma Jeanne Balibar. NE CHANGE RIEN é o filme de Jeanne por Costa, resultado de um encontro perseguido ao longo de alguns concertos, ensaios para a gravação de um segundo disco, aulas de canto lírico, actuações, para dar a ver, sim, Jeanne Balibar, mas com ela o esforço dela, o trabalho de acerto da voz, o trabalho de construção de uma canção, o tra­balho insistente e repetitivo, a concentração, a exigência dos ensaios, a procura do tom justo, o trabalho sobre as pausas, os tempos, as palavras, as frases musicais, as ligações delas 1.

E assim, no universo da música, respondendo claramente ao apelo do magnetismo de Balibar – este é o filme de Jeanne por Costa –, NE CHANGE RIEN traz consigo uma visão do cinema em trabalho. Será subliminar mas é omnipresente, há referências transparentes, e uma imediata associação ao cinema de Costa, à memória dos seus filmes anteriores começando em ligação directa ao princípio, O SANGUE, o preto e branco, a iluminação de O SANGUE, o lirismo de O SANGUE (e as mesmas letras brancas dos títulos, o negro, as sombras recortadas por focos de luz bem preci­sos na imagem, o choque de um abanão sem anúncio com a tortura sentimental das palavras da canção de abertura no lugar da bofetada dada ao rapaz do primeiro filme, desde logo) 2. Nesses vários sentidos, NE CHANGE RIEN – o filme de Jeanne – tem muito de retrato, indisfarçavelmente atraído pelo seu motivo, vem dela a luz do filme, muitas vezes mesmo no sentido literal do termo, nele nos devolvendo muito de auto-retrato – o filme de Jeanne por Costa. É Jeanne Balibar quem ouvimos dizer por duas vezes lembrando a um músico (ou a um técnico de som?), entre sorrisos, que as palavras de apreço incentivador a um ensaio de "Peine Perdue" evocam as que se ouvem dizer no plateau da rodagem de um filme: "Acreditamos em ti." / "No cinema, diz-se 'diverte-te'..." ou, num passo mais tardio, eco desta primeira troca de galharde­tes, outra vez entre sorrisos, "'Diverte-te', como se diz no cinema." É Jeanne Balibar quem traz para dentro do filme o cinema clássico americano quando canta o tema do filme de Nicholas Ray JOHNNY GUITAR. Filmada por Costa, é ela quem guarda a fotogenia das grandes divas nos muito grande planos, sempre em recorte sobre o negro do fundo, sempre semi-iluminados, semi-obscuros (ou o da luz mais difusa em que a vemos cantar o tema do título, "Ne Change Rien", muito próxima do microfone, a câmara muito próxima da cara dela, versão Marlene). Ou então, para além da cinefilia, onde também cabem sombras expressionistas e um vibrante pulsar ame­ricano e negro, é a ela quem Costa filma sentada num banco alto, de auscultadores nos ouvidos ao microfone, em frente a uma tela branca no estúdio de Rodolphe Burger, o segundo protago­nista de NE CHANGE RIEN.
O branco da tela (um ecrã de tripé portátil) destaca desta vez a silhueta escura de Balibar que grava "Peine Perdue" acompanhando-se com os gestos de fluida elegância descritos pelo seu braço e mão direitos. Vemo-la então enquadrada pelos traços geométricos da tela lisa, dela destacada em nítido recorte tridimensional. Mais tarde, noutro momento de ensaio, a mesma tela será cenário de projecção de sombras das personagens que circulam no espaço do estúdio antes de ocupar os seus lugares em frente a ela. O plano começa uma vez mais escuro, abrindo com um ponto de luz (um candeeiro que se acende à direita no fundo do quadro para o jogo das sombras). O pequeno ecrã quadrado branco no fundo da composição do plano, nesse passo, de conjunto e cena de vários movimentos, funciona como elemento do cenário favorável à visibi­lidade da acção e como superfície reflectora trazendo para o interior da imagem uma imagem evocadora da projecção: uma sala escura, uma tela branca. O som traz-nos a música que já se ouve desde o início do plano, mas nesse instante parecemos rememorar uma palavra de ordem do cinema, "Acção!" (por mais arredada que saibamos que ela esteja da prática do cinema de Pedro Costa desde, pelo menos, NO QUARTO DA VANDA, e que entendamos como o dispositivo de NE CHANGE RIEN ferozmente a dispense, seguindo os trâmites em que Costa filmou Straub e Huillet no seu estúdio de montagem em OÚ GIT VOTRE SOURIRE ENFOUI?, o título que na sua obra mais imediatamente com este rima enquanto retrato nascido de um encontro cúmplice di­rigido para a exigência do, e o respeito pelo, trabalho de criação).Assim olhado, NE CHANGE RIEN persegue em dupla linha, no rasto do cinema – questão de cine­filia enraizadamente latente, que os filmes de Costa tanto convocam 3 – e seguindo uma pulsão narrativa que vibra no interior de cada quadro e de cada sequência com os traços de uma histó­ria que entendemos familiar de uma outra, verbalizada por Balibar, "como no cinema".

Enquanto registo do trabalho de um cantor em estúdio, NE CHANGE RIEN filia-se no belo caso de Godard com os Rolling Stones, ONE PLUS ONE, tomando no seu sopro fantasmático a vulnerabilidade de Jeanne Balibar num embate lírico com o preto e branco que molda o filme. Tendo-o abando­nado depois de O SANGUE, Costa voltou a ele aparentemente levado pela questão prática de ter que filmar os concertos de Balibar sem poder interferir na iluminação dos palcos e desgostando dela. O que está no filme é o negro iluminado a branco em afinações muito precisas, um chiaro-escuro belíssimo, a fazer acreditar que à questão técnica sobreveio um apurado gosto pelo tra­balho dessa imagem, tão preciso como os cruzamentos que ao longo do filme põem de acordo as bandas de imagem e som 4. É nele que desfilam, como vinhetas fundidas nos off da música ou dos diálogos, as sequências que compõem NE CHANGE RIEN.
Detendo-nos, em traços muito gerais, no esqueleto do filme seguimos basicamente quatro tipos de situações: quatro momentos de concertos; seis de ensaios, de canções em estúdio e de can­to lírico; três de representações no palco parisiense da cena de La Périchole; dois momentos de camarim ou sala de ensaios, o espaço mais claro e os planos mais brancos de NE CHANGE RIEN, uma sala fechada de espaço ampliado por um espelho na parede do fundo onde, da pri­meira vez, vemos um solitário compasso de espera de Jeanne Balibar e da segunda, sequência final, assistimos a um ensaio da banda e de Balibar, "Rose", penúltima canção do filme. A esta "tipologia" parece escapar um único plano, o "plano Ozu" de NE CHANGE RIEN (perspectiva ao nível do chão num enquadramento onde cabe o tecto da sala em causa, um plano de conjunto de duas velhas senhoras a fumar), um plano de ligação que é uma plácida imagem de pausa, japonesa: um dos concertos de Balibar filmados por Costa teve lugar em Tóquio e este é o plano que o assinala, levando-nos, aliás, a supor, pela posição aproximada da câmara, que as cenas "no camarim branco" são igualmente japonesas.
"Filme de câmara", como o filme de Straub-Huillet, como o filme de Vanda, NE CHANGE RIEN é um filme de espaços interiores. São muito raros os momentos em que o exterior é perceptí­vel: uma janela envidraçada filmada com uma luz muito branca, que dá para fora do estúdio onde Balibar canta emoldurada por ela, à esquerda, e pela tela à frente da qual está sentada ao microfone; ou os reflexos da circulação do trânsito na cidade no vidro da moldura do qua­dro pregado numa das paredes da sala de espera japonesa. São intromissões subtis do exterior nos espaços interiores onde tudo decorre. De resto, NE CHANGE RIEN é um filme de subtilezas, também no que diz respeito à representação, entendendo por ela o que se passa no interior de cada plano, recorrentemente fixos – as mudanças de escala nos planos de conjunto, as altera­ções introduzidas pela iluminação, nestes e nos grandes planos, na mise en scène implicada na própria posição de câmara, no jogo de luz e sombras ou na duração de algumas imagens, por exemplo. Muitos dos seus planos gerais são filmados "como no teatro", do ponto de vista frontal da quarta parede ausente, no caso dos de ensaios e concertos. Curiosamente, quando filma "no teatro" – as sequências de La Périchole de NE CHANGE RIEN, tomadas da mesma perspectiva nos seus vários momentos –, a câmara escolhe desviar-se da boca de cena para assentar numa posição lateral, dirigida à porta de entrada em cena. Nesses planos (algumas vezes vazios, espa­ço para os diálogos e canções fora de campo), as personagens nunca se dirigem à câmara, nem nunca a câmara se dirige a elas. No teatro, os planos de Costa são verdadeiramente planos de discretos bastidores.

O excesso encontra-se na proximidade da câmara dos muito grandes planos do rosto de Jeanne Balibar, vários, em interpelações de vária ordem. Dois dos mais brutais estão nas duas sequên­cias contíguas que mais atentam no esforço do trabalho dela. Uma passa-se no estúdio de Rodolphe, contracampo de alguns campos de Jeanne, começa trauteada (por Rodolphe) no plano que ela ocupa já em andamento, tem uma duração que acompanha a concentração dela e acaba justamente nesse grande plano recortado no escuro cuja última imagem de distensão fixa os músculos do seu pescoço. A segunda, sem corte, toda ela um muito grande plano, acompanha a contida exasperação de Jeanne numa lição de canto de La Périchole em que está a ser dirigida fora de campo pelo professor, cujas indicações nitidamente a desesperam. Nitidamente, porque, tão próximo, o grande plano "trai" a sua contenção, devassando o que vai crescendo de cansaço em nervosismo e irritação.
Momentos de trabalho não são momentos descontraídos, mas muitos (quase todos?) os planos de NE CHANGE RIEN fecham em descontracção, introduzindo no filme essa nota, que também é dele, do directo na banalidade quotidiana das pequenas coisas. Os apontamentos em decres­cendo das conversas sobre frigoríficos, garrafas de vinho e copos de branco pelos quais algumas cenas terminam traduzem a experiência do grupo de amigos concentrados naquilo que estão a fazer, de que o flutuante segmento dedicado a "Ton Diable" é por excelência imagem. Ou seja, a irrepreensibilidade da forma guarda o espaço do impulso da vida. NE CHANGE RIEN não é uma via nova no cinema de Pedro Costa, mas um novo passo de uma via de princípios firmados, aos quais esta faceta de árdua persistência e cumplicidades partilhadas nada tem de alheio. Ques­tões de acordo, diria Godard, que usou antes de Costa a expressão aqui em parte chamada ao título, "Pour que Tout Soit Différent". É todo um programa.


1 NE CHANGE RIEN é composto por imagens de concertos em que Jeanne Balibar interpreta canções do seu primeiro disco, Paramour (2003), dos primeiros ensaios de canções do seu segundo disco, Slalom Dame (2006), composto com Rodolphe Burger, provas de canto lírico e representações de La Pé­richole de Jacques Offenbach levada à cena em Paris, no Théâtre de l'Aquarium, em 2006 (L´Histoire Vraie de la Périchole), numa encenação de Julie Brochen. Há uma primeira versão de curta-metragem com o mesmo título em 2005.
2 Não só NE CHANGE RIEN é, em vinte anos, depois de O SANGUE (1989), o primeiro filme de Pedro Costa a preto e branco, não só a carga poética visual dos dois filmes participa do mesmo tipo de qua­lidades, como as afinidades entre as duas obras podem ser percebidas em detalhes como o tipo de enquadramentos escolhidos. As luzes de palco do primeiro plano de NE CHANGE RIEN evocam, por exemplo, muito nitidamente, o desenho composto pelos múltiplos focos de luz que encimam o plano da nocturna festa arraial por onde passeiam e correm as personagens adolescentes de O SANGUE.
3 Constante das análises dos filmes de Pedro Costa, as múltiplas referências a obras, realizadores e universos cinematográficos são suscitadas pelo seu próprio modo de existência formal. São também normalmente consentidos pelo discurso em primeira pessoa do realizador. Falando de NE CHANGE RIEN aos espectadores que acompanharam a projecção do filme nas últimas edições dos Festivais de Cannes e FidMarseille, Costa referiu concretamente a inspiração no Nicholas Ray de THEY LIVE BY NIGHT (que curiosamente nos pode de novo levar a um regresso a O SANGUE) pensando nas pessoas que filmava em estúdio como fugitivos de cenários nocturnos ou um bando enfiado numa cabana al­gures na floresta.
4 Refere-se como apontamento uma questão em torno da qual é possível esgrimir todo um debate, sem esquecer que este filme, "musical", nasceu de uma proposta de um engenheiro de som, Philippe Morel, amigo comum a Pedro Costa e a Jeanne Balibar. Entretanto desaparecido. NE CHANGE RIEN é-lhe dedicado.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Little White Lies

Interview by James Mansfield

With his debut feature Blood recently given a DVD release and Tate Modern hosting a complete retrospective of his films, Pedro Costa is a filmmaker in demand. From his noirish debut Costa’s focus turned towards the poor immigrants from the former Portuguese colony of Cape Verde and the Fontainhas slum on the outskirts of Lisbon in followup Down to Earth.

After moving away from full film crew productions Costa went to stay with some of the people living in Fontainhas, filming hundreds of hours of footage over many months as they played semi-fictionalised versions of themselves. This led to In Vanda’s Room and Colossal Youth; two masterpieces that magically and devastatingly transform truth and fiction into new realms, creating a blisteringly direct portrait of a community whose inhabitants still retain their mystery. Costa has also made two documentaries, including his most recent film, Ne Change Rien. Costa was in London earlier this month to coincide with a period of increasing interest in his work.


LWLies: Do you enjoy attending retrospectives and talking about your films?

Costa: Yes, because when you talk about something you learn a lot and find yourself saying things you’d never thought about. I try not to be repetitive and instead go a little bit further and try and discover something new. In a situation like this I’m relating and making connections between the films so that’s nice for me too, and is one of the best parts of having the films shown together.

LWLies: So it becomes part of the process to help you move on to the next film?

Costa: That’s especially true in my case because my films are now like Chinese boxes. There’s an obvious connection because I use the same people and shoot in the same place. Sometimes I discover there was something I’d never thought about at length, where just a word in a film can give you an idea. It’s a little bit like how with Colossal Youth the French title is not that at all, it’s Youth on the March. For me that’s like a metaphor of the process, walking and thinking. Making films is also a way of walking. It’s nice to have a programme that’s not only for the audiences but also for me, even if I don’t see the films themselves.

LWLies: Do you ever go back and watch your own films?

Costa: I never watch them again. There’s only one I’m more or less comfortable watching, and that’s the film I made about Straub and Huillet. I can always learn from them.

LWLies: What were your interests growing up?

Costa: My first project was music. I was lucky when I was younger because there were a lot of things happening, the excitement of so many great bands with great lyrics. At the time the experience of listening to something by Wire and PiL was amazing. It was like seeing a Godard film. It was another world where you would get out of the movie theatre. It was a time when the person next door would probably do something amazing, but it wasn’t a commercial competition. There was also a political revolution in Portugal at the same time, where the fascist dictatorship ended and the streets were full of anarchists, communists, and socialists, so from the ages of 13 to 22 I had everything, the music, the cinema, the politics, all at the same time. What this made me see was that John Ford was a hundred thousand times more progressive and communist than so-called left wing documentaries saying things like “film is a gun”, and “change the world”. It was Ozu, Mizoguchi and Ford that were saying that really, you just had to be patient to see it.

LWLies: What was it about these filmmakers that inspired you?

Costa: I’m very attached to a beautiful formula written by Serge Daney, one of the best French critics who I had two or three classes with in Lisbon. He said that with the movies that we like, it is the films that see us. Of course it is you that is watching the film, but the film sees you, it watches you grow up. The film tells you something, to live this way and talk that way. I knew I would like to live in the worlds that some filmmakers showed me, and I could also see immediately that certain films were not for me, because they weren’t watching me. It’s a very beautiful formula, maybe a bit vague or poetic, but you feel it immediately. Films by Straub and Godard knew what I was feeling. It’s something you recognise, it’s like a sect, a club. You feel like you belong to this club and not the other one. With my own films it’s the same feeling. If it feels right it is like the images and the sounds are watching you and protecting you, showing you the way to do this or that. It’s not the script, it’s not your ideas. It’s something more real and integrated and in time. It’s more in life.

LWLies: How did you come to make Ne Change Rien?

Costa: I thought this film was going to be very special and different from the others I’ve made, but in the end the ideas and the form are not really so unlike all the things I’ve been doing. It began as a friendship with Jeanne Balibar. We met seven or eight years ago at a film festival. We were always watching films together and discovered a common sensibility, and then one day she asked me to do a video for a song off her first album. The idea then came for me to be there while she was rehearsing. When I filmed her in concert I didn’t want to do a film like Shine a Light with the camera turning upside down, and I wasn’t interested in doing a ‘making of’ that you have on DVDs with guys in the studio telling jokes and drinking beer.

LWLies: How did your approach for this film compare to the documentary you made about Straub and Huillet?

Costa: When I was there with Jeanne and the musicians I had the same approach as with the other film, discreetly moving around with very small equipment, being really close without disturbing them and trying to keep an eye on what’s happening in the microsecond. It’s so small that the moment where you cut is the time when something happens. It’s so small that you miss it. For both films it was the same fascination because I was watching people I like. What I’m doing is turning these guys into monuments. It’s almost like doing a fiction film because you want them to come out so good, like actors, where you can cut off all the bad parts and the things they don’t do so well. I want Straub and Balibar to be bigger than life, bigger than themselves and bigger than the image you have of them. The structure I made is very fictional because they have to come out like heroes, like the great people I always thought they are, and there was no disappointment.

LWLies: What was the shooting process like for In Vanda’s Room and Colossal Youth, the two films you’ve made without a film crew?

Costa: The shooting takes a very long time, and this changes everything for me. For Colossal Youth we shot every day for two years except on Sundays. I felt for the first time in my life like I was working. I made my first films in five or six weeks and it was a luxury environment I was uncomfortable with. I thought I was too slow to make a film in this time. I always had the feeling that in the last week of shooting I would begin to start discovering the film, realising that we had done everything wrong, so I would have to be asking the producer to give me two or three more days. Of course it’s not that I’m really a slow filmmaker, but that I just don’t want the shooting to end. I want the complication of life to be a part of the film, to make the film. When we started filming Colossal Youth, Vanda told me she was pregnant and a year later her child ended up appearing in the last shot of the film. Of course you can’t script this or suggest such an idea to a producer.

LWLies: How did you persuade the inhabitants of Fontainhas to let you stay with them and film them for so long?

Costa: I had to show them that the film could be possible in another way, without a film crew and the trucks and the money, that it could be possible for me alone with a camera. They had to see how difficult it was for me. They had to see that I came at 9am when they opened the coffee shop and the barber shop and that at 7pm I would close the door. I had to show them it was a common street. That was decisive.

LWLies: Did you feel conflicted about making In Vanda’s Room when there are so many drugs around?

Costa: Vanda has been into drugs since she was 15 and it’s something you can’t avoid. It’s daily life. She smokes heroin and cocaine like I smoke cigarettes, so if you’re with her for an hour you have to see it. For me as a filmmaker, there was a moment where there was an ethical problem that I dealt with silently and alone, asking how it could be done. It’s not that I want to show the drugs, but I cannot avoid it, and so In Vanda’s Room tries to be something else in terms of production and organisation. I am trying to do something more human though. It was not going to be a film about drugs. It was about the place, about the room, about a kind of family and a world seen through my eyes. It’s not the real Fontainhas or the real Vanda, but it’s my eyes seeing her and her watching me. A lot of people dislike because they don’t feel I have the right to film those people that way. I’ve been accused that the film is too beautiful and criticised because we don’t explain how they get the money to buy drugs, but that’s simply because money doesn’t have a value there. They don’t have money and so they have to find it, and normally they find the money and then they spend it immediately on drugs. It goes up in the air. In Vanda’s Room. In most films that show junkies the camera will start turning as soon as they start smoking and we go into this daze and the characters get stupid. For me this was not the case. They were always thinking about serious things. I did not think and plan all this. I just said let it be, knowing that drugs will be there for Vanda and for a lot of people, but taking care that we were not going to make films like anyone else and that these people will think and talk like other people. A lot of documentary filmmakers think you have to make an ugly film, that ethically I have no right to turn them into heroes, but that’s what I wanted. The lesson I learnt from Chaplin and Ford is that people have to walk out better than they walk in. Ventura has to be bigger than John Wayne.

LWLies: How do you determine the right distance to keep when you’re filming?

Costa: I don’t believe a camera can solve or discover the mystery of anybody. It’s very fake, so I don’t pretend I’m close. The distance I keep is just a focal thing, it’s not meant to say I know this person and I want you to feel how he’s feeling. In the case of Ventura the distance is something I cannot avoid. I could never say I understand him or I know what he felt. I’m not black like Ventura or from the same social class. I was not born on Cape Verde and I’ve never been 20 years into taking Cocaine, and they tend to tell me that every second. He said to me at the end of shooting very simply, “don’t ever think you can know me because you have a camera”. I think that’s one of the best principles and lessons you can learn to make film, to think about the distance that will be created between you and what you want to film, and perhaps accepting that it’s very wide between me and him, a deep and long everlasting ocean of mystery that neither of us will cross. But of course that doesn’t mean that he’s not interested in the work. It doesn’t mean that we’re not friends.

LWLies: Do you plan to work with these people again?

Costa: It’s their expectation. When a film is almost over we’re ready for the next one. It’s about them demanding something, and I’ve no reason to go away. I think my next film with them will be about young kids, a younger generation. In the last shot of Colossal Youth Ventura is lying on a bed more or less moaning something and Vanda’s newly born daughter is beside him making some sounds, and I thought that this is probably a good dialogue. I take it as a sign that Ventura finally rests and this new face appears and has this strange coded language that we don’t understand.

LWLies: Can you speak about the films you chose to accompany the retrospective at the Tate?

Costa: If I do this kind of thing it’s about giving the viewer tools that are really proposals saying ‘you can do a film this way’. In the case of Jean-Pierre Gorin’s Routine Pleasures it’s a shoestring budget, two guys and that’s it. With the Jean Eustache film The Pig you see the most amazing way of watching a very ancient ritual of killing a pig, and you see it’s really about the people, not about the animal. I chose Straub for more practical reasons, because Sicilia! is the film that I documented the editing of in Where Does Your Hidden Smile Lie? Straub and Huillet are the filmmakers that give you the feeling that films are meant to be worth something. The Warhol film I show is called Beauty, a film I saw recently and it’s just like In Vanda’s Room, the difference being that he made it without thinking for one second whereas I took two years of pain and blood.


http://www.littlewhitelies.co.uk/

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Entrevista Pedro Costa

Por Miguel Gil

Acabamos de entrar en una zona de impactos. A Pedro Costa (Lisboa, 1959) le cuesta arrancar por las mañanas, o al menos esa es la impresión que da. Pronto enciende el primer cigarrillo. Fuma hasta liquidar medio paquete de tabaco en una hora, el tiempo que dura la entrevista. Contesta con calma, sin que le importe detenerse en cuestiones sobre las que tantas veces habrá reflexionado. Muchos directores pretenden, en mayor o menor medida, intervenir en el mundo. Pero son pocos los cineastas que pueden afirmar con orgullo que la vida intervino en su cine. Costa, como Will More en Arrebato (Iván Zulueta, 1979-80), es un yonqui que se hubiera quedado tan ricamente atrapado en su propia película.


—Aparte de una búsqueda de ideas y de formas cinematográficas estás inmerso en una búsqueda vital, en la que el cine forma una parte pequeña pero que lo tiñe todo. Buscas y miras la sociedad, la economía, la política, el arte…a través del cine.

—El proyecto artístico no es suficiente. Si hacer un film se limitara a poner en práctica un esquema, un programa, una serie de imágenes… si fuese sólo eso un film, creo que no sería interesante para mí. Fontainhas es un caso particular; el barrio físicamente ya no existe, por tanto quedan las personas. Ellas mismas también me piden más o deberían tener más que un film en el sentido de una película corriente. Y yo también necesito y me siento mejor filmando con mucho tiempo, un tiempo que incluye todo: el rodaje clásico, como si fuese un film normal, pero también puede incluir tiempos muy largos, que son de vida, de vivencia en ese espacio, o de conocimiento de las personas. Fueron un conjunto de circunstancias que tenían que ver con la producción, que no me daba tiempo para pensar, para descubrir algunas cosas que sospechaba que podía hacer mejor de lo que lo hacía. El encuentro de este malestar con este espacio y estas personas fue una experiencia muy fuerte la primera vez, y es una cosa que puede durar para siempre. Es evidente que trabajando así, con esta disponibilidad, con esta paciencia sin límites, hay muchas cosas del cine tradicional que no caben, tienen que ser abandonadas, naturalmente son apartadas. Surgen otras nuevas y las que surgen curiosamente son las que más faltan hacen, yo creo, en el cine corriente. Son esas ideas de responsabilidad hacia lo que se filma, hacia las personas y los espacios, un poco más de atención, de responsabilidad. Todo eso podrá materializarse en sentimientos que yo difícilmente encontraría o conseguiría materializar rodando con actores y en cinco semanas. En fin, todo esto que probablemente tenga que ver con mi temperamento, con mi personalidad. Es curioso, porque todo lo que me formó, las cosas que más me gustan, los films que más veo, los de la época dorada de Hollywood, están hechos en condiciones opuestas a esto en términos de producción. Pero al mismo tiempo es con esos films con los que yo encuentro más semejanzas, con ese aspecto de observación, de paciencia, de detalle, de ser un objeto bien trabajado. En mi caso traté de conseguir condiciones para trabajar de esta forma; no son muy complicadas de conseguir, son probablemente arriesgadas, pero los elementos con los que trabajo normalmente hoy en día son mucho más pequeños en comparación con los otros, aunque mucho más adecuados, más conformes a las historias que yo quiero hacer, y creo que se siente detrás de los films, un poco como en el caso de Straub, que es el único caso hoy en día que yo conozco más próximo al cine clásico de Hollywood, en el que realmente hay una adecuación entre los medios y los films.

—Tú evitas el proceso habitual de rodaje, tienes que implicarte de alguna manera.

—Si, es precisamente eso, sólo que no quisiera que fuese mal comprendido. El proyecto no fue porque sentía que no tenía contacto o puentes de ligazón sentimentales con el mundo o con las personas. Era una manera muy fría de poner al cine a trabajar de una forma que me parecía más correcta para hoy, para los tiempos de hoy. El ritual es casi el mismo. Cuando estoy rodando una escena o una secuencia siento que estoy haciendo, y ellos también, un trabajo que es muy parecido al de Lubitsch o Borzage. Es como esa historia que cuenta Jacques Rivette de que se necesita mucho más tiempo hoy en día, cuando aparentemente todo va más deprisa, para ver y oír el mundo, o por lo menos ciertos cineastas necesitan mucho más tiempo. Y yo soy uno de ellos. El trabajo que yo hago en el rodaje incluye todo: preparación, casting, etc.

—Hay un pequeño texto de Fitzgerald, titulado el Crack-up, que empieza diciendo «la vida es un proceso de demolición…». Llega un momento que rompes o cambias tu manera de hacer cine y empiezas a desprenderte de un montón de cosas que te parecen superfluas. Por otro lado, las personas que pueblan tus películas son personas que consciente o inconscientemente están en un proceso de autodestrucción evidente.

—No quiero convertir al realizador en una figura muy romántica o idealizada, un artista que tiene una visión propia, que tiene un talento especial, un poco secreto. La soledad que sentía en un rodaje de los otros films anteriores no era interesante, era una soledad casi vanidosa, que se puede detectar en muchos artistas, en muchos tipos de arte. Tal vez también era una decisión de encontrar gente un poco solitaria, encontrar la soledad de algunas personas y que esa soledad se encontrase con la mía de otra manera. No quiero hablar de autodestrucción, aunque evidentemente también existe. En el caso de Ventura, por ejemplo (en Vanda puede que sea menos evidente, porque es un personaje mucho más extrovertido), no dejan de ser enormes casos de apagamiento, personas que están en fade-out continuo. En el caso de Ventura es muy evidente, es un hombre muy reservado, que nunca ha contado su historia, y no la tiene que contar, no es su obligación contarla. Pero me pareció que mi trabajo como realizador era tal vez encontrar fuerzas parecidas a la mía y Ventura es un ejemplo claro de cómo mi esfuerzo y su esfuerzo se encuentran. Es un encuentro de estas dos soledades, si lo quieres decir así.

—Acostumbrado a rodar en 35 mm, existió un riesgo al decidir cambiar de formato y adoptar el video.

—A pesar de todo hay que relativizar este riesgo, no fue un peligro extremo. Fue muy irracional también. Realmente fue más un descontento. No conseguía hacer un trabajo tal como lo quería hacer. Tenía que hacer alguna cosa, y ese paso al video también facilitó mucho las cosas, claro, y tal vez una aproximación cada vez más evidente que yo sentía hacia cosas más amateurs o no profesionales. Por ahí quizás haya más riesgos, en hacer un trabajo más amateur, de manera más imperfecta quizás, no con tanta seguridad técnica. Es evidente que con una cámara de video, con pocos medios, para hacer un trabajo coherente e interesante se necesita mucha más imaginación o mucha más energía. Se está mucho más protegido con una cámara de 35 mm. Esa ruptura fue puesta en práctica como una prueba. Si hubiese fallado probablemente hoy hubiera regresado a algo más convencional.

—La mayoría de directores utilizan el video de una manera efectista, con mucho movimiento, abuso de la cámara en mano…Tú en cambio no dudaste ni un momento en dejar la cámara en el trípode.

—Si, en ese aspecto no hubo diferencia con los films que hice antes, no fue más que intentar proseguir el mismo trabajo. Pensé siempre en utilizar la cámara de video como si fuera una cámara de 35 mm. Bastante más ligera, bastante menos complicada de manejar. Pero eso no quiere decir que necesite menos atención, o menos cariño casi. En ese aspecto no hago ninguna diferencia entre un rodaje en 35 mm y un rodaje en video. Como había descubierto una manera de trabajar, trate de continuar trabajándola, intentando siempre ir un poco más lejos. No quarto da Vanda era una cosa, Juventude em marcha a pesar de todo era bastante diferente. No se trata de conseguir un efecto de imagen más pobre; tampoco quiero disimular que es video. Desde el primer film que hice la cámara existe, la cámara es con lo que se hace el film. No escogí el video para decir que el cine no existe. En el fondo, con esta sobrecarga de efectos, de movimientos y de falsa velocidad, creo que con esa actitud los cineastas quieren decir que hay más efecto de real, que es más realista, que es más próximo de nuestro mundo por estar hecho de una cierta manera. Yo creo que se equivocan completamente. En mis films no veo razones para hacer este tipo de cosas. Estas cámaras necesitan no solo el mismo respeto, el mismo trabajo, si no todavía más.

—Hay pequeños detalles en No quarto da Vanda que la emparentan con obras de Ozu (Ohayo, 1959) o Buñuel (Los olvidados, 1950), detalles de atrezzo como la cama de la madre de Vanda o el candelabro y la lámpara en Juventude em marcha.

—Es un film que tiene mucha relación con los films de Ozu, o con las cosas que hacían otros cineastas. Este genero de detalles fortalecen mucho; algunos son invisibles para el espectador. Otros son intencionados, para nosotros, casi solo para nosotros. Juventude em marcha es un film en el que Vanda recuerda el cuarto de Vanda. Ese cuarto donde ella vive en Juventude em marcha realiza un poco el mismo sueño, que es mentira, de tener algunos objetos, algunas cosas. Un sueño que todos ellos tuvieron un día de tener un poco más de confort, una imagen de confort que es una ilustración de lo que ellos vieron limpiando las casas de las otras clases, construyéndolas. También quiere decir algunas cosas, quiere decir que el mundo donde ellos viven hoy es más una imagen. Vanda y todos ellos viven mal en aquellos decorados, viven dentro de una imagen, y no saben como funciona o como se tienen que comportar. Ese progreso es muy apreciado por ellos, tienen televisiones de plasma en cada habitación o frigoríficos muy sofisticados. Esto está dicho por el hombre que le enseña a Ventura la casa nueva: “esta mudanza es buena para nuestro futuro”. Lo que yo vi fue lo contrario, y lo que ellos sienten ahora es una gran decepción, porque se gastaron el dinero en ese decorado, en esa mudanza, y en este momento viven tal vez bastante peor de lo que vivían antes, y en todos los sentidos, no sólo en el económico. Han creado una especie de museos. En el caso evidente de Vanda, ella creó un pequeño museo con la imagen más fija posible de una casa pequeño burguesa. Y en este momento atraviesan un momento de lucidez y comprenden que perdieron muchas cosas, que se perdieron ellos mismos, y que se gastaron el dinero. Viven en un decorado pequeño burgués, pero no viven de hecho como la pequeña burguesía, que continúa explotándolos. Todos esos detalles están en el film porque están en las casas, por eso no podía dejar de mostrarlas. No trabajo en ese sentido, no me gusta poner esto allí o quitar aquello otro o pintar una pared. Si alguna vez hacemos alguna intervención son cosas especiales, de espacio para la cámara o para el movimiento de un personaje. Todos los detalles son importantes, y encontrarlos, vivirlos o acompañar este proceso para mí es más interesante que haberlos escrito en el papel. Así, he verificado, he vivido por mí al mismo tiempo que ellos, que son los personajes. Yo viví las mismas cosas cuando llegamos a las casas, llegué con ellos. Cuando vi la casa de Ventura, o la casa de Vanda, por primera vez, cuando entregaron las llaves para visitarlas, la perplejidad de ella estaba muy en sintonía con la mía. La mía era diferente, era “¿cómo voy a filmar aquí?”. Son cosas que no me gustan, que son difíciles técnicamente, son obstáculos. En el caso de Vanda probablemente fue “bueno, es acogedora, pero falta esto y esto otro, voy a decorarla, a mejorarla”. Por tanto nuestra mirada fue relativamente parecida, al mismo tiempo. Por ejemplo, Juventude em marcha no es un film que denuncie nada, no quiere hacer eso, pero una vez acabado y visto por ellos, no niegan ese sentimiento de haber sido engañados. La prueba está en el film, hay un sentimiento de paso en falso, de haberse dejado engañar más de una vez. Y mucha saudade por la comunidad perdida, es evidente, es casi la historia del film. Volver al pasado, volver a lo que se dejó: era difícil, violento, pero tenía una casi alegría a veces, tenía una vida que dejó de existir completamente hoy en día.

—En Juventude em marcha se percibe un cambio en la planificación, en las secuencias…

—En Juventude em marcha quisimos, o yo quise y ellos me acompañaron, hacer un film-film. No hacer alguna cosa muy documental (que No quarto da Vanda tiene, también). Intentamos hacer una epopeya, un film con una ambición un poco épica, con muchos estratos temporales, con flashbacks en otra localización. Por lo tanto, hacer un trabajo muy diferente a No quarto da Vanda. También intentando hacer otra prueba, y probablemente el próximo film tendrá que tener otra cosa. No quería encasillarme en ser un “experto” en películas radicales, largas, entre-documental-y-ficción.

—Cuando llega Ventura al nuevo barrio, los planos contrapicados bastante acusados son absolutamente pesadillescos. Supongo que colabora todo: la óptica de la cámara, el ángulo, los edificios blancos…De repente entramos en otra dimensión.

—Sí, era eso, intentar captar una extrañeza que él sentía. No hay ningún barrio, ni aquí en España ni en Estados Unidos, que tenga esa monumentalidad, ese lado amenazante casi. Por ejemplo, técnicamente, era un trabajo muy intimidante. Era una espacio que amenazaba al cine, no estaba hecho para el cine. Era un espacio al que yo no estaba habituado, era un desafío completamente diferente hacer un film allí, intentar captar esa extrañeza, ese lado casi de ciencia ficción. Cuando Jean-Marie Straub vio Juventude em marcha me dijo algo que ahora empiezo a comprender: que le recordaba a muchos films de Dreyer. Y yo nunca pensé mucho en Dreyer, ni por un segundo, pero ahora empiezo a comprender lo que quería decir. No es sólo aquella extrañeza en la mirada de los personajes de Dreyer, casi sin cuerpos, una especie de almas que se deslizan por el mundo, un poco como ectoplasmas, muy parecido a los personajes de Tourneur. Juventude em marcha tiene otros niveles: Ventura en un pasado, o algunas secuencias del barrio nuevo con él y con otros personajes tienen ese carácter. Después evidentemente esos ángulos un poco más delirantes, muy bajos o altos…normalmente contrapicados.

Juventude em marcha se mueve en diferentes estratos, como las películas de Tourneur.

—Ventura mismo, es una persona con una vida real tan cargada de misterio y de pasado, hablo de su vida, de la realidad. Es un hombre muy destruido, con una gran y profunda tristeza, melancolía. Un hombre destruido por el mundo, por la sociedad, por él mismo. Eso se ve y se siente; lo que hablábamos de aquella soledad, que se identifica, que se siente, se reconoce a veces. Y eso es la esencia del cine. Siempre fue así, los mismos Jean-Marie Straub y Danièle Huillet no pueden negar que este trabajo fue siempre muy solitario. Y si por casualidad consiguen cosas interesantes fue porque también se encontraron con algunas soledades. Ventura fue un operario que no anda lejos del mismo tipo de sensibilidad. Era un tema muy común en los films de Hollywood más sociales de los años 50, Robert Rossen, Dead end (William Wyler, 1937). Ventura es un personaje muy parecido a los de [Nicholas] Ray, que no existe, que es un muerto que habla, una aparición del pasado. Tal vez él existe en el pasado, en aquella zona más extraña, con aquella chabola, con aquella carta, con aquellos momentos más líricos. Tal vez ahí él exista, sea un operario en 1973, y que en los otros momentos del film él no exista, que se trate de una aparición, alguien que va a visitar a sus prójimos. Puede decir “Yo hice…” , “Yo viví…” , “Yo amé…” , y es evidente que le basta decir esto para ser completamente creído. La idea al comienzo del film era esta. Tuvimos siempre la idea de los dos tiempos, uno pasado y otro contemporáneo, y sería Ventura quien ligaba los dos. Una especie de fuerza del pasado. Lo que ocurrió, y yo no esperaba (pero esto pasa en todos los films y pasará siempre), es que yo suponía que la parte contemporánea sería mucho menos dramática o pesimista de lo que es, un poco más parecida a No quarto da Vanda, con un lado más documental. Y que la parte del pasado, con un Ventura más fantasmal, sería la parte sombría, tourneriana, del film. Cambió completamente el film para mí, la parte del pasado parece mucho más realista, casi descripción de lo que era un inmigrante en Lisboa, lo que eran los inmigrantes, como vivían, la música que oían, lo que hacían en el tiempo libre los domingos, o cuando trabajaban. Y la parte contemporánea es la que quedó más extraña y más negra. Una inversión completa. Señal de los tiempos. Lo que ellos quisieron decir es todo muy problemático, todas las situaciones de los jóvenes hijos de Ventura son poco saludables.

—En Juventude em marcha hay un par de personajes inquietantes por lo que les han hecho, por aquello en que se han convertido, el vigilante del museo y el administrativo que enseña los pisos.

—Los dos personajes hacen exactamente en la película lo que hacen en la vida real. En fin, el guardia de museo no es guardia de museo, como él dice es uno de los jóvenes del barrio más activos, aunque tuvo una adolescencia un tanto violenta. En el momento en que filmábamos Juventude em marcha había sido ascendido y era jefe de seguridad de un gran hipermercado. Le propuse hacer de vigilante en el museo y el texto que dice es muy apropiado, fue en parte escrito por mí, con cosas que quería que él dijese que me parecían muy reales, bastante normales y comunes. No tenia que dejar entrar en el museo a Ventura, diciéndole: “intenta comprender…nosotros no pertenecemos a este mundo”, o todo lo que dice después: “tengo que asegurar una paz, una tranquilidad para mi vida, aquí estoy mucho mejor, el trabajo en el que estaba era un mundo en que solo veía lo mismo que en el barrio, tenía que expulsar a las personas que robaban latas de atún”. Él aceptó hacerlo y le dio el toque final al texto. Aprobó todo lo que está en el texto. Es un personaje muy cruel, pero él reconoce esa crueldad. Entre entregar a la policía a hermanos y hermanas que roban en el supermercado o estar para siempre en un museo en la mayor paz de la sala egipcia escoge la segunda, porque no quiere ver más lo otro.


Miradas de Cine, nº 85 Abril 2009

Declaraciones recogidas en Castellón, el 6 de Diciembre de 2008.